Viva, México

Viva, México de Alexandra Lucas Coelho

 

Este livro é a descrição de uma viagem de três semanas da jornalista Alexandra Lucas Coelho pelo México. Nota-se que houve um grande trabalho de preparação para esta viagem. Ao longo das cidades por onde vai passando, há algum contexto histórico (e quão rica é a história do México) e entrevistas.

Gostei particularmente da primeira parte sobre a Cidade do México, da visita à casa de Frida e da conversa com Diego Rivera, o sobrinho-neto do outro com o mesmo nome. Mas o mais surpreendente é a parte sobre a cidade Juárez, na fronteira com os Estados Unidos. Uma cidade dominada pelo narcotráfico e pelas fábricas que produzem, com trabalhadores em condições miseráveis, para os Estados Unidos. É a cidade mais perigosa do mundo e parece inacreditável conhecer algumas das pessoas que lá vivem a vida de todos os dias.

Aprendi muito a ler este livro. Fui marcando passagens, pesquisando no Google por cidades, templos, paisagens, acontecimentos.

O México dá vontade de chorar, um choro de séculos em que não percebemos porque choramos, se somos nós que choramos, se não seremos nós já eles. Nunca, em lugar algum, me pareceu que tudo coexiste, tempos e espaços, cimento e natureza, homens e animais (…) Certa vez, Frida Kahlo descreveu uma imagem a um amigo: «É de dia e de noite, e há um esqueleto (ou morte) que foge espavorido da minha vontade de viver.» Anos depois, pintou Viva la vida por cima de talhadas de melancia, e essa é a sua última palavra.

Fiquei cheia de vontade de visitar o México e de ler outros livros de Alexandra Lucas Coelho.

Opinião do blogue: https://mardemaio.blogs.sapo.pt/

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A Casa Quieta

A Casa Quieta de Rodrigo Guedes de Carvalho 

Páginas:  264

Editor:  Dom Quixote

Este é daqueles livros sobre os quais é difícil falar. Simplesmente porque qualquer coisa que eu diga vai ficar aquém daquilo que ele é na realidade. Eu não conhecia o livro, foi-me emprestado por uma amiga. Ela também não sabia do que se tratava, só tinha lido as primeiras páginas…Salvador é um arquitecto de renome, tem uma bela casa e, mais importante, ama Mariana. Infelizmente esta tem cancro. A narrativa não é convencional, iniciando-se em 2005 quando Mariana já morreu, passando depois para 1985 e regressando ao presente no fim. Isto permite-nos ver a relação do casal antes da doença, os seus problemas, os seus pequenos hábitos criados ao longo dos anos.  A beleza está nos pormenores.

Convém dizer que o estilo de escrita utilizado também não é convencional: os diálogos são incrivelmente expressivos, vivos, reais, misturam-se com o pensamento das personagens. Eu costumo utilizar a expressão “estranha-se, depois entranha-se” (Grande Pessoa), e acho que se aplica como um luva a este livro. A narrativa não precisa ser muito floreada, a palavra é tudo: é fria, polida como o mármore, outras vezes quente, tão cheia e por vezes tão vazia…à momentos em que ler este livro é assustador.

Efectivamente, não há condescendências: o autor não mexe só com as emoções, escava, esquadrinha…toca nas feridas da intimidade humana. Assombrosa a forma como é tratada a perda e a angústia e principalmente a loucura, no papel do irmão de Salvador, afectado pelas memórias da guerra e que vai falando para um psiquiatra silencioso. É um livro emocionalmente muito forte.  

Foi das melhores coisas que já li. A minha parte preferida é da moeda, em que se faz o contraste entre a vida que Salvador e Mariana levam e aquela que podiam ter tido, se tivessem filhos. Nunca nos é dado o outro lado da moeda, o que podia ter sido.

“Repara bem. A vida olhada como uma moeda. Nada de mais redondo, conclusivo, perfeito. Simétrico.

Olha pois. Amacia-a entre os dedos, sente-lhe o peso, avalia as possibilidades.

Escolhe uma face ou deixa que uma face te escolha.

Olha pois. E de um lado tens.”

Definitivamente aconselhado!

Opinião do blogue: https://desabafosagridoces.blogs.sapo.pt/

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